Blog

O que é arquitetura?

08/01/2021

Imagem: Quadro A Escola de Atenas, do pintor Rafael (wikipedia.org)


É incrível notar que, muitas vezes, as perguntas mais simples são aquelas que mais dificuldade temos em responder: quem somos? Para onde vamos? Qual o sentido da vida?

Para esses casos, é válido questionar se a dificuldade de fato está na pergunta ou, quem sabe, habita na nossa resposta, que carrega a responsabilidade de representar a dimensão do nosso entendimento sobre aquilo que nos é questionado.

Sejamos honestos, esse texto não tem ambição alguma em dar sentido à existência humana – deixemos isso para filósofos como Sócrates, Platão ou Aristóteles. Aqui, estamos buscando uma explicação que dê sentido àquilo que entendemos como objeto do nosso trabalho: a arquitetura.

 

Construção coletiva

Para buscar uma compreensão mais completa e democrática, individualmente fizemos essa pergunta para todas as pessoas que colaboram aqui na PLUS Arquitetura. É válido já comentar que, durante as entrevistas, fator comum a todos os entrevistados foi aquele olhar de surpresa e espanto frente à pergunta que, ao menos para nós, não é nada fácil de ser respondida.

Afinal, o que é arquitetura? Como resultado, esse ensaio reúne todas as respostas para apresentá-las a você, enquanto, ao mesmo tempo, estamos também apresentando a nós mesmos.

 

Mais do que uma fachada

Já vamos deixar claro que arquitetura não é só pensar na fachada – por mais que a estética seja fundamental e inerente às nossas vidas. Também não é só fazer uma planta, mesmo que esta seja um dos principais instrumentos de representação do projeto arquitetônico. Entre plantas e elevações que encontramos o dilema clássico da arquitetura: forma ou função? Qual delas deve ser prioridade no trabalho do arquiteto?

“O que é belo é bom e o que é bom depressa será também belo”, diria a poetisa grega Safo. Mas, verdade seja dita: podemos debater amiúde sobre o predomínio da estética sobre a funcionalidade; ou se o mais válido seria o contrário. Porém, essa dicotomia reducionista não consegue abranger todo o espectro dos elementos que compõem um projeto arquitetônico.


Filósofa Safo, em O que é arquitetura?

Imagem: Poetisa grega Safo (ancient.eu)


Ao projetar, sempre pensamos em todos os possíveis condicionantes do espaço: conforto, ergonomia, acessibilidade, funcionalidade, insolação, ventilação, iluminação, economia, técnica, estrutura, estética, dentre outros.

E como equilibrar tudo isso? Cada elemento, cada traço que compõe um projeto deve ser uma resposta à uma necessidade. Nada é gratuito, tudo deve ser justificado. E a justificativa deve sempre buscar a melhor vivência possível para as pessoas que irão habitar os espaços criados através da arquitetura.

 

Empatia

Podemos também entender arquitetura como uma espacialização das necessidades humanas. Por conta disso, vemos que o que realmente importa na arquitetura não é a construção per se; importam as pessoas que farão uso de seus espaços.

Para planejar os espaços que futuramente serão cenário das vivências humanas, o arquiteto sagaz se faz mestre na condição de alteridade. Da empatia. De se colocar no lugar do outro e entender que, além da sua própria, existem infinitas formas de viver uma casa, um bairro, e uma cidade.

 

Da arquitetura, o método

Podemos também pensar arquitetura enquanto um método: uma abordagem sobre um determinado problema. E ressaltamos aqui que esse método deve ser usado independente da escala do objeto.

É por isso que existe arquitetura por trás do design de uma cadeira, de uma mesa ou de uma luminária. Tem também arquitetura nos espaços que habitamos; na casa, seja ela de 400 ou de 40 metros quadrados. Aliás, diga-se de passagem, quanto menor a casa, maior a necessidade de um arquiteto para otimizar os espaços de acordo com a necessidade das pessoas.

E existe arquitetura também na escala urbana, a arquitetura da cidade, como pontua o arquiteto italiano Aldo Rossi. Indiferente à escala, o trabalho do arquiteto consiste em um modo de pensar sobre o espaço. Ao manipular os elementos da construção – os pisos, as paredes, os telhados – estamos condicionando o espaço. E é o espaço que delimita nossas vivências e se transforma no lugar que habitamos.


Aldo Rossi - O que é arquitetura?

Imagem: Arquiteto Aldo Rossi (legacyprojectchicago.org)


Arquitetura e sociedade

Pensando dessa forma, podemos observar que existe uma relação íntima entre estruturas espaciais e estruturas sociais. Chega a ser difícil determinar o limite ao qual podemos mensurar os efeitos da arquitetura, mas o fato é que somos, queiramos ou não, constantemente condicionados pelo espaço à nossa volta.

O espaço nos limita, individualmente, assim como coletivamente. A arquitetura tem o poder de espacializar relações sociais. Logo, a noção de livre-arbítrio é uma ilusão, se levarmos em conta que a arquitetura enquanto estrutura espacial serve como molde para determinar nossas ações e movimentos.

 

 Die Architektur Zeitgeist

Assim, arquitetura é a construção de conjuntos de ideais situados no tempo. Materialização de uma construção social e cultural do homem enquanto coletivo. Nas palavras do arquiteto finlandês Juhani Pallasmaa, as construções da arquitetura concretizam a ordem social, ideológica, cultural e material, conferindo-lhes forma material metafórica.


Imagem: Arquiteto Juhani Pallasmaa (spacecityseattle.org)


Os alemães fazem uso da palavra Zeitgeist para abordar um ‘espírito de época’, ou um ‘espírito do tempo’. Logo, o zeitgeist seria o resultado de uma forma de pensar coletiva, que sintetiza propriedades culturais e intelectuais de um povo em uma determinada época.

Como afirma o próprio arquiteto alemão Mies Van Der Rohe:  arquitetura é a vontade de uma época, traduzida em espaço. A arquitetura pode então ser considerada a materialização do Zeitgeist. Ela é a construção material, física, que representa a construção social, cultural e imaterial de um coletivo.


Imagem: Arquiteto Mies Van Der Rohe (senplo.com.br)


“Arquitetura é um estado de espírito”

Diria o arquiteto Le Corbusier. Mas, longe da perspicácia necessária para responder com uma frase, aqui estamos nós no final do texto, e a resposta ainda parece incompleta.


 

Le Corbusier responde o que é arquitetura

Imagem: Le Corbusier (workagile.uk)


Por fim, é válido comentar que na arquitetura, enquanto moldamos os espaços à nossa volta, esses espaços acabam novamente por nos moldar. Em um processo cíclico, de constante insatisfação, aprendizado e autocrítica, o olhar do arquiteto está sempre evoluindo com o tempo. Nunca está pronto.

 

Referências:

Aldo Rossi. A arquitetura da cidade. Editora Martins Fontes, 2001.

Douglas Aguiar. Alma espacial: O corpo e o movimento na arquitetura. Editora Ufrgs, 2000.

Juhani Pallasmaa. Os olhos da pele: A arquitetura e os sentidos. Editora Bookman, 2011.

Vinicius Netto. Urbanidade como devir do urbano. Eure (Santiago), 2013.

Yi Fu Tuan. Espaço e lugar. Editora Eduel, 1905.

 

   Por Tueilon de Oliveira

Voltar

Leia Também

homem indo a lua

Neoclássico é coisa do passado! Ou será que estamos falando grego?

Veja nossa opinião sobre o Neoclássico, e entenda porquê achamos que o lugar dele é no passado!

Ler mais

Somos todos donos da rua

Entenda o que são ruas compartilhadas e como elas relacionam a sociedade com os equipamentos urbanos.

Ler mais

Contato